Já passei algumas meias-noites em Paris, ora na cama do hotel, ora nas ruas parisienses mas nunca nada de tão extraordinário me aconteceu como a Gil, personagem principal de “Midnight in Paris” o mais recente filme de Woody Allen, o autor de Rosa Púrpura do Cairo que, mais uma vez, faz os seus personagens atravessar a realidade e penetrar numa meta-realidade de outro tempo. O filme leva alguns dos seus personagens numa espécie de viagem encantada a um tempo anterior ao seu, tornando-os mais felizes do que no tempo em que vivem. Trata-se, é-nos revelado ao longo do filme, de uma metáfora, um síndroma de rejeição do presente a favor de um passado que imaginamos mais glamoroso e por isso mais capaz de nos dar felicidade. No rescaldo do filme muitos dos espectadores reencontram-se nestes personagens, identificando-se com eles.
Pessoalmente, não pertenço a esse grupo. Sempre tive uma forte relação com o passado e uma certa nostalgia em relação a algumas coisas dele, nomeadamente dificuldade em me desfazer de certos objectos que simbolicamente representam algo do meu passado afectivo, mas o passado ao qual me sinto ligada é o meu e não o dos meus antecessores, ou seja ligo-me ao tempo em que vivi e não àquele que não conheci. Quando jovem adolescente se questionada sobre uma época em que gostaria de ter vivido diria que não queria regredir séculos mas apenas umas décadas. Gostaria de ter vivenciado os loucos anos 60, a eclosão das grandes liberdades ao som de Beatles e Dylan. Ouvia horas de música dos 60 (e ainda ouço) e achava tudo aquilo delicioso (à excepção das calças boca de sino). Mas durou pouco essa fantasia, depressa percebi que o meu tempo era aquele (mais concretamente à volta dos 80’s) pois ali despertava eu para as minhas próprias liberdades, os primeiros amores, as paixões, as descobertas e a música do meu tempo e não de outro anterior. A hipótese de entrar numa cápsula de tempo nunca me entusiasmou, nem para o futuro e menos ainda para o passado.
Olho com bonomia os trintões pingados, da minha idade, a perseguirem nostálgicos e infantis as modas dos 80, a dançar furiosamente disco-sound, tornando os anos oitenta numa espécie de moda colectiva, esperando transmiti-la aos filhos como uma maldição. É certo que até houve boa música nos 80, mas também uma série de muito maus sub-produtos. Também gostei de ver o Live Aid em directo, ouvir a estreia de Russians ainda no tempo da cortina de ferro, ter presenciado o fim do muro de Berlim e sentir todas essa emoções. Mas como é normal o tempo não ficou parado aí. Os anos noventa trouxeram também extraordinários rasgos de genialidade, ouvíamos a esse tempo Nirvana e Abrunhosa, lutávamos contra as propinas, o império Cavaquista, buzinávamos nas pontes e protestávamos contra Chirac e os ensaios nucleares na polinésia francesa. Não foi, pois, um tempo vazio de românticas lutas e criação artística. Valer-nos-ia a pena refugiarmo-nos no passado dos outros quanto temos um tão rico passado atrás de nós? O futuro é sempre igual, as coisas desgastam-se, desmoronam-se, as fúrias acalmam-se, os guerreiros de antes casam-se, têm filhos e engordam. Kurt Cobain teve a decência de se matar aos 27, mantendo incólume o mito – cumprem-se agora 20 anos da edição de Nevermind, o bébé mergulhador deve ser hoje um jovem adulto que ainda não teve tempo de engordar e envelhecer. Tudo o resto é como sempre, já o magnífico poema “A esplanada” do Manuel António Pina o explicou, os nossos cafés de encantamento transformam-se em balcões de bancos ou supermercados, “Bob Dylan encheu-se de dinheiro” e o Bono também, Abrunhosa foi apanhado pelo Millenium e todos eles têm hoje ar de pais de família abastados, eu própria a meu tempo me converti às bocas-de-sino, entretanto novamente ultrapassadas. Mas ainda assim o passado é o passado, quem quiser voltar aos anos 50 para conhecer o Elvis não vai querer ficar por lá a envelhecer até à sua fase obesa.
Por mim prefiro o presente, a criar futuro todos os dias que há-de ser o passado com que algum tonto mais novo há-de ficar a fantasiar. Nós por cá continuamos a ouvir U2 e Abrunhosa, pois claro. Não por serem passado mas por continuarem a criar.
Pessoalmente, não pertenço a esse grupo. Sempre tive uma forte relação com o passado e uma certa nostalgia em relação a algumas coisas dele, nomeadamente dificuldade em me desfazer de certos objectos que simbolicamente representam algo do meu passado afectivo, mas o passado ao qual me sinto ligada é o meu e não o dos meus antecessores, ou seja ligo-me ao tempo em que vivi e não àquele que não conheci. Quando jovem adolescente se questionada sobre uma época em que gostaria de ter vivido diria que não queria regredir séculos mas apenas umas décadas. Gostaria de ter vivenciado os loucos anos 60, a eclosão das grandes liberdades ao som de Beatles e Dylan. Ouvia horas de música dos 60 (e ainda ouço) e achava tudo aquilo delicioso (à excepção das calças boca de sino). Mas durou pouco essa fantasia, depressa percebi que o meu tempo era aquele (mais concretamente à volta dos 80’s) pois ali despertava eu para as minhas próprias liberdades, os primeiros amores, as paixões, as descobertas e a música do meu tempo e não de outro anterior. A hipótese de entrar numa cápsula de tempo nunca me entusiasmou, nem para o futuro e menos ainda para o passado.
Olho com bonomia os trintões pingados, da minha idade, a perseguirem nostálgicos e infantis as modas dos 80, a dançar furiosamente disco-sound, tornando os anos oitenta numa espécie de moda colectiva, esperando transmiti-la aos filhos como uma maldição. É certo que até houve boa música nos 80, mas também uma série de muito maus sub-produtos. Também gostei de ver o Live Aid em directo, ouvir a estreia de Russians ainda no tempo da cortina de ferro, ter presenciado o fim do muro de Berlim e sentir todas essa emoções. Mas como é normal o tempo não ficou parado aí. Os anos noventa trouxeram também extraordinários rasgos de genialidade, ouvíamos a esse tempo Nirvana e Abrunhosa, lutávamos contra as propinas, o império Cavaquista, buzinávamos nas pontes e protestávamos contra Chirac e os ensaios nucleares na polinésia francesa. Não foi, pois, um tempo vazio de românticas lutas e criação artística. Valer-nos-ia a pena refugiarmo-nos no passado dos outros quanto temos um tão rico passado atrás de nós? O futuro é sempre igual, as coisas desgastam-se, desmoronam-se, as fúrias acalmam-se, os guerreiros de antes casam-se, têm filhos e engordam. Kurt Cobain teve a decência de se matar aos 27, mantendo incólume o mito – cumprem-se agora 20 anos da edição de Nevermind, o bébé mergulhador deve ser hoje um jovem adulto que ainda não teve tempo de engordar e envelhecer. Tudo o resto é como sempre, já o magnífico poema “A esplanada” do Manuel António Pina o explicou, os nossos cafés de encantamento transformam-se em balcões de bancos ou supermercados, “Bob Dylan encheu-se de dinheiro” e o Bono também, Abrunhosa foi apanhado pelo Millenium e todos eles têm hoje ar de pais de família abastados, eu própria a meu tempo me converti às bocas-de-sino, entretanto novamente ultrapassadas. Mas ainda assim o passado é o passado, quem quiser voltar aos anos 50 para conhecer o Elvis não vai querer ficar por lá a envelhecer até à sua fase obesa.
Por mim prefiro o presente, a criar futuro todos os dias que há-de ser o passado com que algum tonto mais novo há-de ficar a fantasiar. Nós por cá continuamos a ouvir U2 e Abrunhosa, pois claro. Não por serem passado mas por continuarem a criar.
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