segunda-feira, maio 26, 2014

Crónica de Segunda - Uma crónica de falecimento colectivo.

As minhas crónicas de segunda não costumam abordar a política, se entendermos política como o comentário aos partidos, suas diatribes, discursos de líderes, etc, já que, de outra forma, tudo é política. "Mesmo caminhando contra o vento/ dás passos políticos/ sobre solo político", diria Szymborska pelo que, e atendendo à ventania contra a qual me vi obrigada a caminhar hoje todo o dia, me vejo na necessidade de abrir as portas desta crónica à política dita “pura e dura”, aquela que se jogou ontem em eleições europeias.

Cansados que andaremos todos de comentadores encartados e criticadores de campo e de bancada vou-vos poupar à intrincada análise da óbvia derrota da coligação de governo contra a pífia vitória socialista, que perdeu votos em todas as direcções – da esquerda do PCP, em claro crescimento, ao populista Marinho Pinto, antes defensor da abstenção e agora defensor de não sabemos ainda bem o quê. Dispensar-me-ei também ao comentário de derrota do BE repartido pelo Livre e por outros que tais.

Dispenso-me ainda a comentar as reacções, todas diferentes, todas iguais, dos que ganhando por pouco histericamente clamam vitória ou dos que perdendo expressivamente exultam por a vitória dos adversários não ser afinal tão grandiosa. Tudo isto são notícias velhas. Fica-me o pensamento encalhado (e encolhido) ao perceber as astronómicas percentagens de vitória de partidos nacionalistas, de extrema direita e neo-nazis, bem como marginalmente também alguns de extrema esquerda como na Grécia. A Europa como União desmorona-se a olhos vistos mas mais assustador ainda é ver este crescimento nos concidadãos europeus, filhos de Roma e da Grécia, de ideais que achei terem sido enterrados em Nuremberga. Isso sim assusta-me e entristece-me.

Porém esta crónica era apenas o pretexto de me questionar, de olhos arregalados: que povo é este o que temos? Que cobarde e ignorante gente é esta que, quarenta anos postos sobre o 25 de Abril, que nos abriu a liberdade não só de expressão mas mais, muito mais, a liberdade de escolha, de sermos cidadãos por inteiro, de nos podermos expressar como tal escolhendo os que queremos que nos governem, se nega esse direito, despreza a luta de tantos e se deixa assim cair nesta abulia?

E quem são, ou onde estão, os magotes de gente que encheram praças em diversas manifestações, os polícias endiabrados que subiram escadarias de faz de conta? Onde estão os críticos de café? Os indignados da vida? Os que cantaram grândolas? Bem sei que há uma leva recente de emigrados que não puderam votar e não serão assim tão poucos, mas com franqueza…66,6%? Somos 33,4% apenas de gente viva? Alô? Está alguém aí?

Não me venham, estes defuntos, depois com queixumes ok?


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