Sentada no café olho através da montra e o Verão continua esta frouxa coisa, apagada, que se tem mostrado pelo Porto, à excepçãode duas ou três semanas de sol refulgente, mimetizando os trópicos, que nos apanharam de supetão logo no estrear da estação. Agora, apagadinhoe cinzentão, com a temperatura indecisa de uma Primavera mal nascida, deixa-nos mordendo os dias à espera de férias na ilusão que rumando a sul as coisas se recomponham. Num assomo rápido aos títulos dos jornais percebo que o mundo não parece em consonância com a tez gris com que a meteorologia nos brinda, nem com a minha própria tendência depressiva face à folha sem palavras onde me aprazaria ver a crónica já escrita – e sobre o quê, meu Deus, sobre o quê? O mundo lá fora, dizia eu, rejubila!
Como se uma esplendorosa Primavera se esmagasse contra o vidro o mundo que leio nos jornais é uma só rejubilação. Os partidos do governo e seus apaniguados rejubilam por não caírem do poder, felizes de empurrarem com a barriga um programa de governo genial que felizes nos há-delevar ao segundo resgate, e ao terceiro e aos que mais vierem, tão certeiros eram os cálculos gasparinos que este se pôs a mexer apenas dois anos tarde de mais. Mas graças aos Senhor (aos senhores?) tudo muda para que tudo fique na mesma, as taxas de juros sobem e a dívida soberana também. Uma maioria,
um presidente, um programa de sucesso, assim sim andamos em frente, o
precipício aguarda-nos! Rejubilemos!
Em Inglaterra
um casal de príncipes vai parir uma benfazeja criança, que a acreditar nos
bruxos que por lá moram, há-de ser carismática e sensata – valha-nos ao menos
isso já que a sensatez parece cada vez mais um bem escasso e em vias de
extinção. Um povo inteiro, mais uns quantos mirones por todo o mundo aguardam
que a coroável cabecita saia, rejubilante também, das entranhas da real mamã. Ainda
mal gerada estava a criatura já o mundo se acotovelava para a fantasiar e
noticiar, uma imigrante indiana – a quem interessa isso? – mal compreendendo
que o mundo é um ninho de víboras mediáticas matou-se por falta de cautela,
outros chamar-lhe-iam incompetência, ou dito de outro modo foi troçada até à
morte por uns engraçados entertainers
televisivos australianos – benditos sejam pelas audiências, rejubilemos!
Ainda nos
jornais uma jovem norueguesa de 24 anos rejubila com o seu passaporte na mão
por ter sido perdoada, no Dubai, do terrível crime de se deixar violar. Toda a
ideia de uma pessoa ser violada, procurar a polícia para se queixar e acabar
presa e acusada por esse mesmo facto me deixa rejubilante, mal posso com tanta
alegria e jubilo!
Portanto talvez apenas eu, e o tempo
lá fora, não rejubilemos com tanta alegria que vai pelo mundo mas ao olhar
agora a página já cheia a cheirar a crónica completa quase me apetece também
rejubilar!